sábado, 4 de maio de 2013

O NASCIMENTO DE BRASILIA

Embrapa anuncia a criação de mais uma vaca clonada. Primeiro bovino do país gerado a partir de células do tecido adiposo, o animal foi batizado em homenagem à cidade

Clara Campoli

A bezerra Bras�­lia, ao lado da m�£e de aluguel, Marina: o parto, normal, aconteceu no �ºltimo dia 23 (Gustavo Moreno/CB/D.A Press)
A bezerra Brasília, ao lado da mãe de aluguel, Marina: o parto, normal, aconteceu no último dia 23


A capital do país ganhou uma filha mais que especial. A bezerra Brasília, nascida há 11 dias, recebeu esse nome por ter vindo ao mundo em uma data tão próxima à que Juscelino Kubitschek escolheu para inaugurar a cidade. O animal é um clone, fruto de pesquisas feitas na Embrapa — Centro de Transferência de Tecnologias de Raças Zebuínas com Aptidão Leiteira (CTZL). Depois de três tentativas que resultaram em abortos ou em filhotes natimortos, a quarta gestação chegou até o fim e resultou na pequena Brasília.

O tempo de gestação de um bovino varia de 290 a 295 dias, mas foram necessários quatro anos para que a nova integrante do rebanho da Embrapa chegasse. Todo esse período de pesquisa havia resultado, até o último dia 23, em alterações nos anexos fetais e em anormalidades na placenta, que geraram os experimentos mal-sucedidos. A gestação de Brasília, no entanto, correu tão tranquilamente que os pesquisadores até se perguntaram se aquela era mesmo a gravidez de um clone. O resultado chegou depois do nascimento: no exame de DNA, está comprovado que o material genético da bezerra é idêntico ao da vaca que doou o núcleo celular, Acácia.

Brasília é o primeiro clone bovino gerado sem doação de material embrionário no Brasil. Até então, só haviam sido bem-sucedidos os processos com núcleos de fibroblastos, células retiradas de embriões. A novidade é que, no novo procedimento, a célula doada é de tecido adiposo, uma fonte de células-tronco. O método provou ser mais fácil e eficaz, tendo em vista a proporção do sucesso: em quatro tentativas, uma deu certo. “O tecido adiposo é um material que nos agradou muito, foi surpreendente. Para nós, isso representa uma possibilidade de melhoria na técnica, além de taxas maiores de produção de embriões e de gestações completas. É bastante animador, isso incentiva a pesquisa”, comemorou o cientista à frente do projeto, Carlos Frederico Martins.

Com a novidade, a perspectiva é que o próximo passo seja clonar bovinos transgênicos, ou seja, com o material genético manipulado para determinados fins. A ideia principal é inserir no leite das vacas proteínas humanas, como a insulina, por exemplo. A possibilidade de fazer esse uso do material genético já foi testada e comprovada por outros cientistas. Enquanto isso, Brasília, que foi monitorada de perto durante os quase 10 meses de gestação, continuará sob vigilância constante dos pesquisadores. “Vamos observar o desenvolvimento dela, avaliar o comportamento reprodutivo, analisar a lactação quando for a hora. A questão do leite é muito importante para essa pesquisa”, explicou Martins.

Quando era uma bezerra, Acácia era marrom, idêntica a Brasília. O clone, depois de crescer, vai ter a pelagem cinzenta, como a da doadora. As duas, no entanto, não se reconhecem nem mesmo pelo cheiro. A bezerra, da raça guzerá leiteiro, é muito apegada a Marina, a mãe de aluguel da raça girolando, que acolheu o embrião e pariu o clone (veja infografia acima). As duas tiveram um estranhamento no começo, mas muito mais porque a vaca adulta, do pelo preto, é também mãe de primeira viagem. Hoje, a relação das duas, que não têm qualquer gene compartilhado, é de mãe e filha: Marina é uma vaca dócil e tranquila, mas se irrita quando os cientistas seguram Brasília por muito tempo. “Ela é sossegada. Pior seria se a mãe de aluguel fosse da raça nelore, porque aí a gente não ia conseguir nem chegar perto”, explica Martins.

Parto normal
O clone nasceu em fim de expediente. Os pesquisadores estavam de saída, prontos para fechar a chácara, localizada próxima ao Gama, quando resolveram dar uma última verificada em Marina. “Nós olhamos de última hora e as patinhas dela já estavam para fora. Se a gente tivesse ido embora sem checar, Brasília teria morrido”, lembra Carolina Gonzales, doutoranda da Universidade de Brasília que trabalha em parceria com Martins no projeto.

A correria para o nascimento da bezerra assustou os pesquisadores. “Quando nós estamos com uma gestação, fazemos uma previsão do dia em que ela pode nascer, mas a Brasília veio antes. Ficamos nervosos, porque aí tivemos que correr para pegar os materiais enquanto o parto ia acontecendo. A Carol teve uma prévia do que é ter um filho”, brincou Martins. A jovem, que é muito apegada à bezerra, conta que, ao fim do processo, não aguentou a emoção e caiu no choro, dentro do laboratório onde produziu o embrião que se tornou Brasília.

Geralmente, quando a gestação é de um clone, os cientistas precisam induzir o nascimento, ou até mesmo fazer uma cesariana. Marina entrou em trabalho de parto sozinha e teve Brasília de forma natural. Ela veio ao mundo com 35kg, um pouco mais leve que a maioria dos bovinos clonados. Não precisou de suplementos alimentares e, só com o leite da barriga de aluguel, vem engordando a olhos vistos.

Ao contrário da arisca Acácia, a bezerra Brasília não é nada brava: adora uma sombra e tem muita preguiça de ficar em pé. “Ela é igual a um bebê. Mama, deita e dorme”, diz Martins. O comportamento merecerá uma análise à parte. “Vamos criá-la no cabresto, com bastante contato humano. Ela provavelmente será dócil”, explica o cientista. 

Fonte:  Correio Brasiliense
Postado por Dr. Lima

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