Por José
Mendes Pereira
Já fazia dois
dias que o jovem motoqueiro chegara à região de gente desnutrida e infeliz,
montado em sua velha e desarrumada lambreta, fabricada no ano de 1964,
conduzindo uma bolsa a tiracolo, um chapéu de abas longas, vestido numa jaqueta
azul, e enfiado ao guidão, uma sacola preta.
Ninguém sabia
nada sobre a vida do motoqueiro. De onde vinha aquele sujeito feioso, que mais
parecia uma ruma de ossos em movimento? Tísico, com uma deformada corcunda.
Quem o era? O que queria daquele lugarejo tão paupérrimo? Os moradores já
censuravam que aquele indivíduo era um fiscal do governo, um espião das coisas
do Estado, ou simplesmente um delinquente sem rumo e sem pretensões para o
futuro, que havia fugido de alguma casa de saúde, para pessoas com
problemas mentais.
Mas, vez por
outra, o motoqueiro ia ingerir uma dose de cana no bar da freguesia, e ao
chegar, era observado pela freguesia, que o observava com rabos de olhos
maldosos.
O dono do bar,
querendo saber um pouco sobre a sua vida perguntou-lhe:
- Por mal
pergunta se não lhe incomoda, o jovem é de onde, e faz o que na vida?
- Sou do Pernambuco do Lampião. Terra dos homens que não medem tamanho de
bigodes de macho. Sou esculápio registrado, e filho da viúva do sargento "Mão Pesada".
O comerciante
encerrou ali mesmo as suas perguntas. Já deduzia que, apesar do seu corpo de
caveira, aquele jovem não era boa peça. E também nunca ouvira falar nesta tal
profissão, "esculápio". Achava ele que, o jovem já tinha dito tudo,
um marginal de primeira classe, filho de um homem com o apelido de "Mão Pesada", era sem dúvida, um perverso, um criminoso qualquer.
Assim que o
jovem lambreteiro saiu do bar, o comerciante chamou a atenção dos fregueses,
que tivessem cuidado! Aquela caveira humana dissera que era esculápio, e todos
ficassem de olho nele, porque não era conhecedor de tal nome
"esculápio".
Na verdade, o
homem mais instruído no lugarejo era ele, o dono do bar. E se ele não conhecia
tal nome "esculápio", o caveira poderia ser mesmo um marginal de
primeira categoria.
Assim que a
notícia espalhou-se pelas pequenas ruas do lugarejo, duas beatas que rezavam
terços na capela organizou logo uma procissão. Era preciso logo. Só assim o
jovem esculápio sairia da vila o mais rápido possível.
Em uma das
reuniões no conselho comunitário, o presidente alertou aos moradores, que o
jovem lambreteiro poderia ser um assassino cruel, e que todos evitassem manter
contato com ele, só assim, ele iria se sentir excluído, e desapareceria o mais
rápido possível do lugar.
No momento em
que acontecia a reunião no conselho comunitário, o médico que dirigia um
pequeno posto de saúde, ao descer do automóvel, estava acompanhado do jovem
lambreteiro. Os presentes ficaram assustados e se perguntando? Por que o médico
de nome e renome se mistura com um sujeito tão feio e perigoso assim?
Entraram. O
médico pediu a palavra ao presidente do conselho, pois precisava apresentar o
novo funcionário do Posto de Saúde. E deu início dizendo-lhes:
- Meus amigos!
Este jovem que me acompanha e que está ao meu lado esquerdo, será o novo médico
de vocês nesta comunidade. Ele é um dos maiores e capacitados médicos que já
apareceu no nosso Estado. Formado pela USP - Universidade de São Paulo. Espero
que todos vocês o recebam com muito carinho.
Todos ficaram
de boca aberta, pois jamais esperariam que um sujeito tão feio, magro, com
aspecto tuberculoso, desajeitado, sem presença física, além do mais com uma
horrível corcunda, chegara a ser médico. As aparências enganam.
Esculápio
significa "Médico".
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