quarta-feira, 5 de julho de 2017

SOBRE O AMOR

*Rangel Alves da Costa


Inegavelmente que o amor é um dos mais belos sentimentos existentes no âmago do ser humano. O simples ato de amar já torna a pessoa mais meiga, branda, terna, ornada de contentamento e felicidade. Enquanto sentimento íntimo, o amor humaniza o ser, torna-o compreensivo e compartilhador; enquanto sentimento amoroso, a outro devotado de coração, torna a pessoa esperançosa e tomada de possibilidades boas na vida.
Desse modo, jamais há que se negar a importância do amor na vida de uma pessoa. Somente através deste sentimento afetuoso, somente por meio da sensação de revelar-se através de uma luz no coração, somente na certeza da felicidade existente, a pessoa se torna capaz de enfrentar os desafios e não se deixar abater por míseros problemas tão impeditivos de realizações.
Para muitos o amor é tudo; para outros o amor é a maior expressão que possa existir num ser; para outros, o ato de amar significa acobertar-se do bem contra todo mal e negatividade. Seja como for, verdade é que o amor, ou a busca de sua verdade, é o desejo mais almejado entre os racionais. Viver sem amor, muitos dizem, é conviver com a escuridão e o sofrimento.
Contudo, a primazia do amor não lhe afasta das críticas, das considerações negativas, das muitas inconveniências originadas em seu nome. Já que o amor é tudo, dizem, então seria também tudo aquilo que em seu nome é praticado. Daí ser o gume afiado de muitos males. E certamente muito se pratica com a pecha amorosa e mais tarde é revelado como graves problemas a ser resolvidos.
Pois o amor, segundo também afirmam, é sentimento envolto de tamanha força que tem o dom de cegar, de tirar completamente a razão da pessoa, de deixá-la à mercê das ilusões e das fantasias, até mesmo as mais absurdas. Em tal estágio, agindo assim perante o indivíduo, eis que o amor acaba se transformando numa verdadeira armadilha, num abismo por onde se caminha sem saber.
Não que se revele no amor uma infinidade de tragédias, mas não se pode deixar de reconhecer algumas reconhecidas inconveniências, ou mesmo absurdos praticados e vivenciados em seu nome. Ora, todos sabem que o amor desmedido, afetando a mente a ponto de fragilizá-la, é arma perigosa demais para ser carregada ou manejada. As consequências, pois, do amor doentio, são as mais devastadoras possíveis.
Até que se poderia afirmar que não se pode ter como amor a expressão doentia em seu nome. Não se deve esquecer, contudo, que tudo nasce exatamente da doce e maravilhosa inocência desse sentimento maior. É a forma como ele vai se exteriorizando, ganhando força e se apoderando do ser que poderá transformá-lo numa arma fria e cruel. E até mortal.
Não são poucas as notícias dando conta das atrocidades cometidas tendo o amor - ou a paixão desenfreada, como estágio amoroso irracional - como elemento ou força propulsora de desvarios e aberrações. O noticiário sensacionalista diz que alguém matou por amor; a manchete estampa que a paixão provocou mais uma tragédia; as delegacias estão repletas dando conta de ocorrências envolvendo ciúmes.
As loucuras por amor são muitas. Quando os limites do desejo são ultrapassados e no outro lado está a paixão doentia, então é situação de difícil retorno. A cegueira passional é tamanha que absurdos são cometidos em nome do desnorteado amor. O beijo na boca vermelha pode se transformar na vermelhidão agressiva ou na humilhação escravista, de feridas e dilaceramentos. E depois, quando perguntado pela loucura cometida, ainda dizer que foi por amor demais.
Mas não só de sangue vive tal inversão amorosa. Ora, mesmo em situações rotineiras, sem violências ou agressões, o amor é causador de males reconhecidamente profundos. O fato de ser abandonado por alguém que tanta ama se constitui num exemplo clássico de indescritível sofrimento. Até mesmo as brigas corriqueiras e as separações rotineiras acabam se tornando em instantes tortuosos. Sem falar na saudade, na tristeza da recordação, na dor da espera, na crueldade do pensamento martelando o nome e a feição.
Talvez seja pelo dom de açular intensamente os extremos, ou o amor amado e correspondido e também o amor doloroso e violento, é que tal sentimento se torna único e tão instigante. Contudo, mesmo que mais tarde desande e se revele em obsessão doentia, a verdade é que nasce sublime e esperançoso. E porque surge assim, tão doce e encantador, que toda pessoa quer amar.
Querer amar, eis o sonho maior. Encontrar um amor, eis uma possível realidade. Daí em diante é que os campos floridos se estendem em meios a pedras e espinhos. Felizes aqueles que conseguem vencer os desafios e seguir cada vez mais distantes. E ainda de braços dados. E mais felizes ainda quando os passos, mesmo sem caminhar, não saem de pertinho do outro.

Escritor
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